sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Dia 23/11/2010 – Terça – Feira / BANZEIRANDO – Uma Jornada Teatral pelos Rios da Amazônia / Diário de bordo e terra


Amanhecendo em Cujubim Grande, localidade de aproximadamente 28 famílias, ainda em Porto Velho. Há duas escolas para onde convergem alunos de várias localidades menores. Aqui os alunos chegam de voadeira, que são as lanchas pequenas motorizadas, onde cabem em média dez alunos. As voadeiras chegam e os alunos sobem a escadaria estreita de madeira no barranco de uns dez metros de altura. Sobem como se caminhassem normalmente, tamanha prática.
O dia começou com o clarear do sol as 06h, já com um calor de aproximadamente 25 graus. Chicão se desbancou pras escolas, quando chegou não encontrou alguém, só mais tarde chegou uma aluna dizendo que era cedo demais. Chicão se deu conta de que o tempo é outro e parece muito mais lento por essas bandas. Na seqüência Chicão agendou as primeiras apresentações do Projeto Banzeirando, para as 09h, 10h e 15h.
Na Escola Municipal de Ensino Fundamental Deigmar Moraes, os atores Léo Carnevale e Nivaldo Motta apresentam as cenas, mágicas, gags e improvisos com o público, com seus personagens Afonso Xodó e O Dorminhoco. Ambos arrebentam com um show de variedades.
Na outra Escola, Professor Raimundo Nonato, teve apresentação às 10h do Tancredo Silva, com o Velho Justino e suas poesias matutas. Nesta escola há uma lista na parede da sala dos professores que me chamou a atenção. Todos os nomes são derivações, posso estar enganado, de nomes estrangeiros: Dhieni, Alecsandro, Wellington, Cristian, Stalen, Eliton. Me causou um estranhamento, que aconteceu também na apresentação do Justino que ao chamar algumas vezes os alunos para participarem todos tinham nomes estrangeirizados. Justino saiu com esta pérola: Vixe! Aqui todos têm nomes importados? Porque não colocam João, Maria, José, Raimundo, que fica mais fácil pro véio! Todos caíram na gargalhada.
Após a apresentação durante uma conversa a professora Valéria, formada em Física e Matemática, mas que leciona Inglês e espanhol, nos diz que há influência de uma colônia norte americana nas proximidades, também que muitos turistas e aventureiros passam por ali, até escoceses! Mas, sobretudo, a televisão ainda é forte influenciadora nestes nomes.
Após as apresentações Dona Branca caminha pela comunidade conversando e colhendo frutas fresquinhas para os sucos e lanches. Há Tucumã, Manga, Cupuaçu, Jaca, Caju, Jambo, etc. A comunidade é bem pequena, aqui há duas escolas, um posto de saúde (que o médico comparece só aos finais de semana), bares, um campo de futebol (sempre há muitos bares e um campo de futebol!), um armazém e umas 20 casas.
Na apresentação da tarde, chegamos à escola Deigmar Moraes novamente e a professora de Artes, Andréia, estava realizando um trabalho de mesa com livros do MEC, onde há peças curtas. Ela explicava o enredo e sua trama, perguntando sempre se os alunos entenderam o final da história. Como professor sempre utilizei estes livros fininhos que todas as bibliotecas escolares possuem e me perguntava se eles chegavam nas escolas mais distantes do Brasil, ou quantos professores exercitavam a leitura e reflexão destas histórias junto aos alunos, se praticavam também a escrita dramatúrgica, se encenavam estes textos e com que freqüência. Conversamos um pouco e nem tudo ela pratica, pois também não tem conhecimento suficiente para trabalhar estas variações do ensino de teatro. Mas na medida do possível já faz um trabalho muito bom por aqui, parabéns para a índia Professora Andréia.
Um fato na apresentação do Léo me chamou a atenção, como metáfora desta jornada. Quando ele chamou um aluno para participar de uma mágica, perguntou seu nome e o menino disse Hércules! Todos caíram na gargalhada, pois era um rapaz magrinho e encurvado, e pelo visto com muita preguiça e sono. Pensei comigo mesmo que era mais uma metáfora do que viria a frente, uma proeza herculínea pela diversidade de cada localidade: barrancos altos, temperaturas elevadas e de variações rápidas e muitos, mas muitos mosquitos! Há Carapanã, Mucuim, Mutuca, Moscas, etc, adivinha que sangue eles preferem? Dos gaúchos é claro! Só com muito repelente no couro pra agüentar!!!
No meio da tarde Léo e Nivaldo apresentam em duas escolas com o mesmo sucesso de participação de público. No final da tarde fomos todos para o barco e começamos nossa primeira pescaria. Cada um com seu caniço e logo são pescados os primeiros Mandins, que possuem três ferrões que se cravar nos dedos dói muito por dias seguidos.
Uma curiosidade é o peixe Candiru, o que também é um desespero pelo rio Madeira, semelhante a um tubarão, só que de vários tamanhos pequenos. O mais perigoso é o menor de todos, fino como um dedo mínimo de criança, ele entra pelos orifícios da pessoa que estiver na água. Sim isso mesmo! Ele entra pelo orifício do pênis, pela vagina ou ânus. Ao entrar numa destas cavidades se desloca e incha arrebentando tudo por dentro. Também come, mastiga as entranhas destas partes. Assim como o tubarão este carnívoro é atraído pelo cheiro de sangue, mas há algo peculiar nele, também é atraído pelo cheiro de urina.
Há muitos relatos sobre este peixe. Certa feita um bêbado foi fazer xixi na água perto do bar em que bebia, quando voltou os amigos notaram que escorria um sangue pelas pernas do vivente. Ele estranhando foi verificar ali mesmo, cambaleando de bêbado, e todos viram o candiru com metade do corpo esguio já dentro do pênis. Só então o dormente bebum se desesperou, pois não percebera que o candiru havia saltado pelo caminho do jato da urina. Logo os amigos amarraram o pênis do homem impedindo que o candiru entrasse mais, ele possui três mandíbulas afiadas e gruda arrebentando tudo por dentro. Não tem como puxar com as mãos porque é muito liso e escorregadio. Correram de voadeira para o hospital, chegando lá o peixe estava inchado e o pênis parecendo que explodiria. Todo tempo o bêbado gritava desesperado. Dias depois voltou para o trabalho próximo do bar e estava tudo tranqüilo, mas seriam meses sem beber até poder tirar um grande numero de pontos internos e externos da delicada operação.
Há outro relato, de uma menina de 15 anos, pensei em não colocar aqui, mas por questões de igualdade de gênero colocarei. É mais breve, provavelmente porque quem contou a história foi um homem. Uma família estava se banhando numa pequena praia num fim de semana ensolarado. Seus pais e tios ficaram na areia e os pequenos brincavam na água. A menina que estava menstruada não havia entrado na água pelo desconforto de sua situação. No entanto o calor era tanto que resolveu dar somente um mergulho. Assim fez e logo saiu aos gritos, correndo em direção aos adultos. Os adultos foram socorrê-la e logo viram o rabinho do candiru por fora do biquíni. Em segundos ele já havia atravessado o absorvente mordido a pele, o tio da menina deu um puxão e arrancou o candiru.
Então, vocês acreditam nestas histórias? Será história de pescador? Não. Todos na região acreditam. Dizem que há vídeos no You Tube, um sobre o corpo de um trabalhador ou bêbado que foi encontrado morto no rio, crivado de candirus saindo por todo corpo, é só procurar por candiru. Ainda não vimos um desses, mas a expectativa é muito grande.
Ficaremos esta noite pernoitando em Cujubim, devido à energia elétrica. Este fator será um dos condicionantes do tempo de permanência nas localidades, são muitos alimentos perecíveis a bordo em quatro freezers. Amanhã cedo iremos para as localidades de Agro-Vila e Bomserá.
Vamo que Vamo!!
Márcio Silveira dos Santos
Grupo Teatral Manjericão

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